Thomas Hobbes de Malmesbury[1]
5) Origens:
05 de abril de 1588, aldeia de Westport, próxima a Malmesbury, Wiltshire,
Inglaterra. "De família pobre, filho de clérigo semiletrado". Estudou
cultura clássica (latim e grego), e se
entusiasmou pela retórica. Mais tarde foi preceptor de William Cavendish,
o Conde de Devonshire. Hobbes dedicou-se a leitura dos historiadores clássicos
(Homero, Heródoto, Tucídides), cujos aspectos literários e intuição política
lhe interessaram. Em 1629, traduziu a Guerra do Peloponeso, de Tucídides.
Nele, antecipava insinuações que viriam no Leviatã, já manifestando sua aversão
à democracia (no tocante à demagogia e ignorância em seus constituintes), e
recomendava Tucídides: "um rei é mais capaz que uma república". Mais
tarde, já com a idade avançada, traduziu a Ilíada e a Odisseia, de Homero.
"Acreditava no propósito didático do poema heroico".
Entre a Filosofia, a Política e a Literatura
6) Entre 1621 e 1626, Hobbes foi secretário do
empirista Francis Bacon (1561-1626). Assim como os
grandes racionalistas de seu tempo, Hobbes também se dedicou à leitura de Elementos
da Geometria, de Euclides
(séc. III aC.). Em 1624 esteve com o Padre Marsenne,
na França, amigo de Descartes
(1596-1650). Também se encontrou com Galileu Galilei
(1564-1642), na Itália.
7) "Em 1640, colocou-se como defensor do rei, Carlos
I (1600-1649), então ameaçado por uma revolução
liberal. Em apoio ao soberano, compôs seu primeiro tratado, Elementos
da Lei Natural e Política*,
obra destinada a fundamentar a ciência da política e da justiça".
Em 1642,
exilado em Paris, publicou Sobre o Cidadão*,
mesmo ano em que se desencadeou a guerra civil na Inglaterra. Sentimentos
ateístas exibidos na publicação vieram a dificultar, mas não o impediu, que
fosse o preceptor do príncipe de Gales,
futuro rei Carlos II
(1630-1685), da Inglaterra.
Em 1651, publicou Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil*, sua obra principal, ao qual se seguiram muitas controvérsias a respeito de suas opiniões religiosas e políticas.
Em 1652, Hobbes retorna a uma Inglaterra dominada pela
revolução liberal de 1642, comandada, com mão de ferro, por Lorde
Cromwell (1599-1658), que garantia o sentido econômico-burguês
da revolução.
Em 1654, publicou Sobre o Corpo* e,
em 1658, Sobre o Homem*.
Em 1660, veio a Restauração dos Stuart, seu antigo pupilo, o rei Carlos
II, foi restituído ao trono, mas com seus já avançados
72 anos, Hobbes preferiu se dedicar à literatura, traduzindo partes da Ilíada e
da Odisseia. "Faleceu em Hardwick, em 1679, dez anos do triunfo das ideias
liberais das quais fora ferrenho adversário".
Entre a Experiência e a Razão: O homem moderno buscava uma nova atitude de pensamento. Certo antagonismo reflexivo, à antiga escolástica medieval, se fazia necessário diante dos novos rumos tecnológicos e do conhecimento científico impressos pela modernidade. Em pauta, a filosofia experimental de Francis Bacon e o racionalismo de René Descartes, na busca de um sólido ponto de apoio em comum, como que partindo de opostos conflitantes, alcançássemos conciliações quase veladas, secretas, lançando luz para o exercício de ações conjuntas. Hobbes sabia fazê-lo.
8) A matemática e a lógica:
Hobbes deduz sua ciência política de conceitos e definições a partir de fatos
da natureza humana, fatos concebidos pela experiência, e como um geômetra
aplicado, estrutura todo o seu pensamento em bases sólidas e contínuas, num
encadeamento lógico-dedutivo apropriado ao seu projeto teórico político.
Segundo Hobbes, "lendo-se a si mesmo", cada um deve encontrar a
humanidade. Seu texto é escalonado, seus argumentos sucedendo-se umas aos outros em
rigorosa construção lógica.
9) O
racionalismo matemático empirista de Hobbes:
Em Sobre o Corpo declara que "concluir é
adicionar e subtrair". A filosofia seria um "conhecimento adquirido
por um raciocínio correto, dos efeitos ou fenômenos conforme as causas ou
gerações concebidas [dedução] e, inversamente, das gerações possíveis conforme
os efeitos conhecidos [indução]". Seria esse um tipo de "racionalismo
empirista", partindo da natureza e a ela voltando.
"O real é reduzido a elementos simples, a fim que se possa utiliza-los numa dedução capaz de recompor as realidades concretas. Inicialmente atomizado, o real é idealmente encontrado", ou seja, "um racionalismo metodológico e nominal que arma e encadeia suas teses" no campo empírico.
"O real é reduzido a elementos simples, a fim que se possa utiliza-los numa dedução capaz de recompor as realidades concretas. Inicialmente atomizado, o real é idealmente encontrado", ou seja, "um racionalismo metodológico e nominal que arma e encadeia suas teses" no campo empírico.
Hobbes X Descartes
"Descartes recebeu, através do Padre Marsenne, as
objeções levantadas por Hobbes contra suas Meditações Metafísicas", publicada
em 1641, juntamente com as objeções deste e de outros filósofos.
10) O
Corpo como sujeito que pensa: na
Segunda Objeção, Hobbes aceitando a célebre frase cartesiana
"penso, logo existo", coloca um problema: de onde viria o conhecimento
da preposição 'eu penso'? Alegava que: "como não podemos conceber ato sem
o seu sujeito, assim também não podemos conceber o pensamento sem uma coisa que
pense, a ciência sem uma coisa que saiba e o passeio sem uma coisa que
passeie". Logo, sugere, "que uma
coisa que pensa é alguma coisa de corporal".
Descartes "não admite que todas as substâncias sejam corpóreas", alarga o conceito de substância para o de 'matéria metafísica', dessa forma abrangendo a possibilidade de duas substâncias: a corpórea (extensa, que compreende a grandeza, a figura e o movimento), e outra incorpórea (espiritual, pensante). Esses últimos atos residem em "uma coisa que pensa", sem nenhuma afinidade com os atos corporais. "O pensamento... difere totalmente da extensão".
Descartes "não admite que todas as substâncias sejam corpóreas", alarga o conceito de substância para o de 'matéria metafísica', dessa forma abrangendo a possibilidade de duas substâncias: a corpórea (extensa, que compreende a grandeza, a figura e o movimento), e outra incorpórea (espiritual, pensante). Esses últimos atos residem em "uma coisa que pensa", sem nenhuma afinidade com os atos corporais. "O pensamento... difere totalmente da extensão".
Nominalismo (palavras): Na Quarta objeção, o
nominalismo de Hobbes: "redução do conceito a palavras, de significações
ideais a significações convencionais". Hobbes pergunta: "se talvez o
raciocínio não seja outra coisa senão uma reunião e encadeamento de nomes pela
palavra 'é'?" (...) "pela razão, nada concluímos no tocante à natureza
das coisas, mas só no tocante às suas denominações; isto é, pela razão, vemos
simplesmente se reunimos bem ou mal [V ou F] as coisas, segundo as convenções
que, de acordo com nossa fantasia, tenhamos feito no tocante às suas
significações".
O espírito, corpo em movimento: segundo Hobbes, "o raciocínio dependerá de nomes, os nomes dependerão da
imaginação, e a imaginação (...) dependerá do movimento dos órgãos corporais; e
assim o espírito não será outra coisa senão um
movimento em certas partes do corpo orgânico".
Espaço e movimento:
"Hobbes universaliza o mecanicismo. Para ele, 'toda mudança se liga ao
movimento de corpos modificados, isto é, de partes do agente e do paciente'. O
espaço é a primeira das nações fundamentais de sua filosofia" (...): 'é o
fantasma de uma coisa que existe enquanto existe, isto é, enquanto não se
considere nela nenhum acidente, a não ser aquele de aparecer fora daquele que o imagina'. "Existir é existir no espaço, é
ser corpo em movimento".
As Palavras e as Coisas
11) O espírito mecanicista da
coisa: em Sobre o Corpo (1641), o sentido mecanicista na
filosofia de Hobbes: como os corpos exteriores afetam o homem produzindo as
sensações, percepções e os demais fenômenos do espírito. "Afetados pelos
movimentos dos objetos exteriores, os sentidos seriam postos em movimento e
estes se transmitiriam ao cérebro e, daí, ao coração; neste órgão, começaria um
movimento de reação em sentido inverso. Para Hobbes, o início desse movimento de
reação é precisamente o que constitui a sensação:
A Sensação: 'a sensação é o principio do
conhecimento dos próprios princípios, e a ciência inteiramente dela derivada'.
A Teoria Nominalista da Arquitetura Cientifica (os
Nomes, a Matemática e a Lógica): os nomes, "alicerçados
nas sensações", produziriam uma somatória que conduziria à ciência (e
ciência entendida como um 'conhecimento das consequências de uma palavra à
outra'). "Uma vez bem definidos, os nomes são conectados nas preposições e
essas são conectadas nos silogismos". 'A proposição é constituída pela
adição de dois nomes; o silogismo pela adição de duas proposições; a
demonstração, pela adição de vários silogismos'. A conclusão "é de todas
as proposições antecedentes".
A Questão Nominalista dos Universais: em Sobre o Corpo, explica: 'Os conceitos que, no espírito, correspondem aos
nomes comuns (que designam coleção de indivíduos) são imagens ou fantasmas de
objetos singulares. Desse modo, para se compreender o valor do universal, não
se tem outra faculdade que não a imaginativa, faculdade que nos lembra de que
as palavras desse gênero suscitaram em nosso espírito uma coisa ou outra'. Há certo
associacionismo psicológico: "as imagens associam-se na consciência,
formando um discurso mental". A razão,
atenta, se aperfeiçoaria ao encontrar o nexo correto que associaria essas imagens.
12) A Razão,
"o uso aperfeiçoado da imaginação, pela aplicação correta da análise (que
descobre noções e definições, partindo da experiência) e da síntese (deduções
que, a partir das primeiras ideias, provam e explicam todas as
realidades)".
O Conhecimento,
então, é explicado a partir do entrechoque de corpos, “movimentos exteriores
que, por meio dos sentidos, atingem o espírito (um corpo tênue e sutil),
repercutindo uns nos outros, associando-se", organizando-se num sistema
científico.
Do Conato à ação Política (ou do desejo à ação)
Teoria Materialista da Estrutura da Realidade: segundo Hobbes, um impulso ou aspiração natural (o conato, o desejo), seria o
ponto de partida de toda ação humana (moral ou política). 'O movimento que
consiste no prazer e no desgosto, é uma solicitação ou provocação para se
aproximar do que agrada ou para se retirar do que desagrada; e essa solicitação
é o esforço ou começo do movimento interno animal'.
O Determinismo Mecanicista Competitivo em Hobbes: a
partir desse ponto de partida conatural, Hobbes explica, por exemplo, a
percepção visual: 'a visão se faz por ação derivada do objeto; toda ação é um
movimento; o movimento é propagado da luz ao olho'. A tendência no sentido dos
objetos que favorecem o indivíduo, o 'bem'; o 'mal' seria a aversão ao objeto
que causa a dor. "A vida comparável a uma corrida na qual é preciso vencer
sempre": 'Estar ultrapassado continuamente é miséria; ultrapassar
continuamente quem está adiante é felicidade. Abandonar a corrida é morrer'.
13) Liberdade:
'ausência de tudo que impede a ação e que não está contido na natureza e na
qualidade intrínseca do agente'. O livre-arbítrio, uma ilusão: "uma
expressão destinada a ocultar a ignorância das verdadeiras causas das decisões
humanas".
Do Estado Natural ao Estado Social
O Estado de Natureza: em Sobre o Cidadão, uma de suas frases mais citadas: 'O
homem é o lobo do homem'; seguida por outra: 'Guerra
de todos contra todos'. Esse estado de natureza
caracterizaria o homem antes de seu ingresso ao estado social. No estado de
natureza, 'a utilidade é a medida do direito'.
Levado por suas paixões, o homem conquistaria o bem, aquilo que resulta em
prazer. Uma inclinação geral de todo o ser humano, o conduziria a 'um perpétuo
e irrequieto desejo de poder e mais poder que só termina com a morte'.
Direito fundamental de auto conservação:
apesar de adversário político da democracia (neste caso, admitia as assembleias
soberanas), Hobbes acreditava que 'todos os homens são
naturalmente iguais' e, para que cada qual não se
torne um lobo em relação ao outro, em guerra de todos contra todos, se faz
necessário um pacto de conservação da vida, um acordo artificial de
preservação.
14) O Contrato Social:
guiado pela razão, os homens são obrigados a
estabelecer contratos entre si. O contrato é 'uma transferência mútua de
direito'. O pacto social introduz a ordem moral, garantia do contrato: "a
promessa de cumprir o contrato vale, enquanto a conservação da vida não estiver
sendo ameaçada". E, ainda segundo suas leis: ‘que o mal seja vingado sem
crueldade, que haja moderação no uso dos bens; (...) havendo disputas, que se
recorra a um árbitro imparcial e desinteressado'.
O Contrato Social em Rousseau
(1712-1778): "para quem o homem é naturalmente bom, naturalmente livre e
naturalmente igual aos outros homens" (...) "manifesta-se em um pacto
estabelecido entre o povo e os governantes. Esse pacto estabelece a submissão
dos governantes, assim como de todos os cidadãos, à Vontade Geral", (...)
"manifestada pela maioria absoluta".
O Pacto Social: "O
contrato é estabelecido unicamente entre os membros do grupo que, entre si,
concordam em renunciar a seu direito a tudo para entrega-lo a um soberano
encarregado de promover a paz".
Absolutismo sem Teologia
15) Hobbes "é partidário do
poder absoluto e, admite, ao mesmo tempo, o pacto social". Segundo ele, o
pacto, sendo artificial e precário, não seria suficiente para assegurar a paz,
se fazendo necessário que "cada homem submetesse sua própria vontade à
vontade de um único homem ou a uma assembleia". "O pacto conduziria
necessariamente ao absolutismo". "Hobbes
não deriva o absolutismo de um direito divino, mas do pacto".
Também acreditava que o poder centrado em um único homem evitava "as competições comprometedoras da paz" entre os vários rivais e representantes do poder. "Não submetido a nenhuma lei, o soberano absoluto é a própria fonte legisladora. A obediência a ele deve ser total (pois teme a ignorância de seus súditos), a não ser que ele se torne impotente para assegurar paz durável e prosperidade".
Também acreditava que o poder centrado em um único homem evitava "as competições comprometedoras da paz" entre os vários rivais e representantes do poder. "Não submetido a nenhuma lei, o soberano absoluto é a própria fonte legisladora. A obediência a ele deve ser total (pois teme a ignorância de seus súditos), a não ser que ele se torne impotente para assegurar paz durável e prosperidade".
16) "Ao soberano político
deve pertencer (...) todo poder de decisão em matéria religiosa, em virtude de
a religião implicar a existência de um poder distinto da soberania civil,
originando conflitos", não por 'falsidade dos dogmas, mas porque a natureza
dos homens é tal que, vangloriando-se de seu suposto saber, querem que todos os
demais julguem o mesmo'. Desta forma, "a religião ameaçaria o estado
civil". "O estado deve instituir um culto único e obrigatório",
sendo o fundamento da paz religiosa, condição da paz social, "o
conformismo e não a tolerância".
1689 - Hobbes viveu os conflitos gerados entre o poder real e
o poder do parlamento, na Inglaterra do século XVII. Decidiu "pelo
fortalecimento extremado da autoridade, pelo militarismo do executivo, pelo controle
severo de todas as formas de criação cultural". "Em 1689, as forças
liberais que predominavam no Parlamento inglês derrotaram definitivamente o
absolutismo real".
Publicações
1640 - Elementos da Lei Natural e Política
1642 - Sobre o Cidadão
1651 - Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado
Eclesiástico e Civil
1654 - Sobre o Corpo
1658 - Sobre o Homem
[1] Hobbes de Malmesbury, Thomas
(1588-1672). Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e
Civil; tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São
Paulo : Nova Cultural Ltda. 1999. Os Pensadores.
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