Cap. I – Ato Voluntário*
Ato voluntário e involuntário: uma
força de ação original, explosiva, das paixões, e outra força da razão
deliberativa, das escolhas, da ação, se estendem sobre a natureza voluntária ou involuntária dos atos humanos. Nelas, o
exame da ignorância das circunstâncias, o fato do agente arrepender-se ou não.
Se se arrepende, o ato é involuntário;
se não se arrepende, embora o ato não seja voluntário,
o ato não é propriamente involuntário, mas não-voluntário.
“A
virtude se relaciona com paixões e ações” (1109b30), e estas, quando voluntárias, se relacionam com honras e castigos;
quando involuntárias, com perdão
e piedade.
Paixões e ações voluntárias
dispensam louvor e censura; as involuntárias,
“merecem perdão e às vezes piedade” (1109b31). É importante ter em mente que ambos os termos devem ser usados com
relação ao momento da ação, aquilo que acontece em determinada circunstância.
Involuntárias: causa exterior, o princípio não está no agente + o
agente não conhece as circunstâncias da ação.
Ocorrem sob compulsão ou por ignorância (ignora as circunstâncias do ato
e dos objetos). “E é compulsório ou forçado aquilo cujo principio motor se
encontra fora de nós e para o qual nada contribui a pessoa que age e que
sente a paixão” (1110a). Produz dor e arrependimento.
Não Voluntário: “tudo o que se faz por ignorância” (1110b17), mas não causa dor nem arrependimento.
Voluntário: o princípio está no agente + o agente conhece as
circunstâncias nas quais a ação ocorre.
Os atos são escolhidos. O principio motor se encontra em nós (fazer ou
não fazer). Somos responsáveis por nossas escolhas, temos uma finalidade que
buscamos alcançar. Conhecimento, escolha certa e firmeza são condições necessárias
à prática das virtudes.
Toda escolha
deliberada é voluntária, mas nem todo ato voluntário (aquele gerado a partir de
certo impulso) ocorre por escolha deliberada. É como ocorre com as crianças e
os animais que possuem razão deliberativa apenas de forma parcial, incipiente.
Cap. II – Impulso e o que não é
Escolha
Segundo Aristóteles, animais e crianças participam de ações voluntárias
mais não de escolhas. As ações voluntárias são impulsivas, acontecem no
“estalão do prazer e da dor”; já as escolhas demandam reflexão, conseguinte de
certa maturidade e experiência, cabendo à razão determinar a ação correta em
cada circunstância. “Embora chamemos voluntários os atos praticados sob o impulso
do momento, não dizemos que foram escolhidos” (1111b9).
O Impulso: três objetos de escolha instigam os homens: o nobre,
o vantajoso e o agradável; e seus contrários, o vil, o
prejudicial e o doloroso. “Medimos nossas primeiras ações pelo estalão do
prazer e da dor” (1105a5). Já a escolha envolve o pensamento.
Escolha não é Prazeres: o impulso é primário, comum às partes do irracional,
relaciona-se mais com o agradável e o doloroso, assim como o apetitivo e a
cólera; os atos inspirados no impulso “são considerados ainda menos objeto de
escolha do que outros” (1111b19);
Escolha não é Desejo: “a escolha não pode visar a coisas impossíveis” (1111b20), escolhemos aquilo que julgamos capazes de realizar
graças aos nossos próprios esforços. “O desejo se relaciona com um fim e a
escolha com os meios” (1111b27). Desejamos saúde e escolhemos atos sadios. Desejamos a felicidade e
atuamos com as coisas possíveis capaz de realiza-la.
Escolha não é Opinião: a opinião se relaciona com todo tipo de coisa
possível e impossível, com verdadeiro e falso; a escolha se relaciona com o bom
e o mau, com o belo. “A opinião geral não é idêntica a nenhuma espécie de
opinião (...) por escolher o que é bom ou mau somos homens de um determinado
caráter, mas não o somos por sustentar essa ou aquela opinião”; ou seja, quando
escolhemos nos relacionamos com o objeto conveniente (reto, “sabemos ser o
melhor”); quando opinamos nos relacionamos convenientemente com o objeto e,
neste caso, seremos louvados se a relação for verdadeira.
Abrindo um parêntese: em biologia moderna, a transmissão do impulso nervoso: http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Histologia/epitelio29.php
Escolha deliberada se relaciona com os meios para alcançar um fim. "É
a determinação que a razão impõe no domínio prático” (ZINGANO, 2008,
12); ou seja, aquele esforço reflexivo e prático que
demanda a realização de determinada ação, aquilo que está em nosso poder. No
caso da saúde, por exemplo, não escolhemos com acerto a saúde, mas os meios
para alcança-la: “desejamos gozar saúde, mas escolhemos os atos que nos
tornarão sadios” (1111b27).
“A escolha
envolve um princípio racional e o pensamento” (1112a17).
Não deliberamos sobre 1. Coisas eternas (como a matéria do universo); 2. Coisas
em movimento que acontecem sempre do mesmo modo (como os solstícios); 3.
Acontecimentos fortuitos (encontrar um tesouro); e 4. Alguns assuntos humanos (política
exterior);
Deliberamos sobre coisas que nem sempre acontecem do mesmo modo, “que estão sob o
nosso alcance e podem ser realizadas” (1112a30), a partir de nossos esforços, a exemplo da navegação ou tratamento
médico. E como “causas admitimos a natureza, a necessidade, o acaso, e também a
razão e tudo que depende do homem” (1112a31).
“Delibera-se a respeito das coisas que comumente
acontecem de certo modo, mas cujo resultado é obscuro” (1112b9). Não deliberamos acerca de fins, mas a respeito de
meios (1112b12).
Aquele que delibera investiga, analisa como agir: “Dão a finalidade por estabelecida e consideram a
maneira e os meios de alcança-la; e, se parece poder ser alcançada por vários
meios, procuram o mais fácil e eficaz; e se por um só, examinam como será
alcançado por ele, e por que outro meio alcançar esse primeiro, até chegar ao
primeiro princípio, que na ordem de descobrimento é o último” (1112b15).
Razão: “toda deliberação é investigação”. Investigação dos meios, como
usa-los ou produzi-los, para alcançar o fim premeditado.
X
Ação: “e o
que vem em último lugar na ordem da análise parece ser primeiro na ordem da
geração” (1112b24).
Buscamos realizar o que nos é possível. Aristóteles
entende coisas possíveis como “aquelas que se podem realizar pelos nossos
esforços; (...) isto inclui as que podem ser postas em prática pelos esforços
de nossos amigos, pois que o princípio motor está em nós” (1112b28).
O Sopro: “O homem é o principio motor das ações” (1112b31).
Objeto de escolha: “aquilo por que nos decidimos em resultado da deliberação” (1113a3), da reflexão de como agir. Deliberamos para escolher
o bem. “A escolha é um desejo deliberado de coisas que estão ao nosso alcance” (1113a10).
Cap. IV – O Desejo
“O desejo tem por objeto o fim” (1113a15), um bem aparente para cada pessoa em particular. Mas para o homem bom, o bem
é absoluto. Só ele “aquilata toda classe de coisas com acerto, e em cada uma
delas a verdade lhes parece com clareza”. É assim capaz de “perceber a verdade
em cada classe de coisas como quem é delas a norma e a medida” (1113a30).
Cap. V – Meio e Fim
O Fim: aquilo que desejamos, o Bem;
O Meio: “aquilo acerca do qual deliberamos e que escolhemos”
(1113b5).
Depende de nós o agir e o não agir. Acertar entre dois vícios o alvo, a
ação reta, voluntária, num contínuo exercício das virtudes em direção ao belo. Em
Aristóteles o homem assume essa responsabilidade racional, voluntária e, acima
de tudo, efetiva, da atividade, do fato sendo realizado: “depende de nós
praticar atos nobres ou vis, e se é isso que se entende por ser bom ou mau,
então depende de nós sermos virtuosos ou viciosos” (1113b10).
Ação voluntária: o princípio está no agente e o agente conhece as
circunstâncias nas quais a ação ocorre. “Os atos cujos princípios motores se
encontram em nós devem estar em nosso poder e ser voluntários” (1113b20). Por conta disso, os vícios da alma e do corpo são
voluntários, “ao passo que ninguém censura os que são feios por natureza,
censuramos os que o são por falta de exercício e de cuidado” (1113b25).
Formação do caráter: é no exercício diário, atuando sobre objetos
particulares, que forjamos nosso caráter. E é nossa disposição de ânimo que
revela o quanto somos responsáveis pelo bom ou mau que visamos como fim. Segundo
Aristóteles, “todos os homens desejam o bem aparente, mas não têm nenhum
controle sobre a aparência; e que o fim se apresenta a cada um sob uma forma
correspondente ao seu caráter” (1113b32);
A boa estirpe: julgar com acerto e saber escolher o que é
verdadeiramente bom não é fácil; e essas coisas nem podemos adquiri-las ou
aprende-las de outro. Mas, sim, recebe-las com agrado como um dote da natureza,
pois “ser bem e nobremente dotado dessa qualidade é a perfeição e a cúpula de
ouro dos dotes naturais” (1114b10).
A virtude é voluntária (assim como o vício), pois somos responsáveis por
nossas disposições de caráter: “ao homem bom e ao mau, o fim aparece e se
estabelece naturalmente ou de qualquer modo” (...) “algo todavia também depende
dele; (...) uma vez que o homem bom adota voluntariamente o meio, a virtude é
voluntária – o vício não será menos voluntário” (1114b15).
As virtudes são meios (em ação) e disposição de caráter. Quanto aos
meios, no que depender de nós, tendemos a agir de acordo com a regra justa,
assim como está “em nosso poder agir ou não agir de tal maneira” (1115a).
*ARISTÓTELES (348-322 a.C). Metafísica : livro 1 e
livro 2 ; Ética a Nicômaco ; Poética ; seleção de textos de José Américo Motta
Pesanha ; trad. Vincenzo Cocco; -- São Paulo : Abril Cultural, 1979. (Os
pensadores).
ZINGANO, Marco. Aristóteles : tratado da virtude moral
; Ethica Nicomachea I 13 - III 8, Obras comentadas. -- São Paulo : Odysseus
Editora, 2008.
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